Herbert Araújo
Por algum motivo, provavelmente por
orgulho, egocentrismo, ou seja lá qual for o termo adequado e com a finalidade
de defender a si próprio, à sua família ou suas “propriedades”, a humanidade
tem manifestado em diferentes culturas a tendência a construir barreiras que os
separe de alguma coisa ao seu redor ou mesmo dos seus semelhantes. Instinto
territorialista e gregário é muito comum nos mamíferos, sobretudo nos primatas
(ordem de mamíferos à qual pertencemos), mas isso não explica todas as
barreiras que construímos.
Alguns muros, como os de Tijuana
e Berlim, são visíveis e é mais fácil de serem criticados, mas alguns muros invisíveis,
como o preconceito racial, xenofobismo e antropocentrismo são muralhas
gigantescas que separam povos, culturas e, o que a meu ver é ainda mais grave:
separa a humanidade da natureza. Sim isto é muito mais grave, pois em parte é
por esse preconceito que hoje se discute a possibilidade de destruição, não de
um único povo ou etnia, mas de toda a espécie humana e também de muitas outras
espécies além dos nossos recursos naturais, que são fundamentais em qualquer
sistema político e econômico. No meio acadêmico, o discurso de que estamos em
uma crise planetária é cada vez mais frequente. O termo “crise planetária” pode
gerar confusão. Não é o planeta que corre perigo, mas sim nós mesmos e
precisamos urgentemente repensar qual o nosso lugar no meio ambiente.
Realmente, desde que o arsenal
nuclear de incontáveis megatons não seja detonado, o planeta deve estar a salvo
pelos próximos quatro bilhões de anos, enquanto o sol estiver existindo. Mas a
vida no planeta está sofrendo constantes agressões que infelizmente só viemos
reconhecer quando começaram a prejudicar a nós mesmos. A Terra já passou por
cinco grandes espasmos de extinção em massa. Períodos em que a biodiversidade
do planeta foi quase completamente aniquilada e, graças aos processos
evolutivos, novas espécies foram repovoando o planeta e se adaptando aos
“novos” ambientes. A mais famosa extinção em massa ocorreu no Cretácio, quando
desapareceram dinossaouros, pterossaouros bem como répteis e invertebrados
marinhos, definindo o fim da Era Mesozóica (a “era dos répteis”). Com menos
répteis, o planeta passou a ser o palco da irradiação dos mamíferos, o grupo
mais importante da atualidade (Era Cenozóica). Mas esse não foi o único, e em
ordem cronológica, levando em consideração o período geológico, eis as grandes
extinções em massa da história da Terra: Ordoviciano (440maa), Devoniano
(365maa), permiano (245maa), Triássico (210maa) e Cretáceo (66maa).
Todos esses processos de extinção
foram responsáveis por criar novas condições de vida, novos ambientes, novos
mares, cadeias montanhosas como a Cordilheira dos Andes e o Himalaia, a separação
dos continentes, a criação de Madagáscar, as mudanças climáticas globais e, é
claro, novas espécies ou modificações no corpo e na mente delas (evolução dos
instintos), foram acompanhando o ritmo do planeta, o que nos leva à inevitável
conclusão de que a nossa história enquanto espécie está eterna e completamente
ligada a toda a história da biodiversidade terrestre, e quando defendemos essa
biodiversidade, defendemos o banco genético e os recursos naturais renováveis
que estruturaram física e mentalmente nossa espécie, que nos mantém dependentes
de todas as outras (afinal estamos em uma teia alimentar), que formaram os
solos em que fundamos nossas nações e que sustentam nossos sistemas econômicos.
Mas infelizmente, a humanidade
tem pavor de se ver como um animal, como uma espécie viva, biológica, o homem
sente orgulho de dizer que não é mais natural, que gerou “progresso” desfazendo
os elos que a natureza levou mais de três bilhões de anos para aperfeiçoar,
conectando por meio de uma infinita série de tentativas, erros e acertos e se
valendo das forças físicas e energias fundamentais os átomos, moléculas,
células, tecidos, indivíduos, populações, comunidades, ecossistemas... Até hoje,
como e quem somos, se explica num contexto ambiental que não está separado da
nossa cultura, pois cada cultura se desenvolveu em um suporte ecológico, a
partir de um banco genético e se valendo de recursos naturais diferentes
(dependendo da escala temporal que adotemos), isso, em parte explica porque
populações humanas desenvolveram-se de modo tão diferente em diferentes regiões
e até mesmo, em menor parte, como os povos ocuparam seus espaços (por favor,
não estou afirmando que ela explica tudo, a mente humana tem uma bagagem
cultural muito evidente!), afinal, todos sabemos que a varíola foi tão
importante quanto a arma de fogo para aniquilar os ameríndios (de história
imunológica mais recente e mais vulneráveis a doenças), mostrando mais uma vez
como a nossa dimensão biológica é fundamental até mesmo para os processos
culturais.
Tais questões são muito amplas, não dá para
colocar todos os pontos aqui, quem sabe em uma outra postagem? Eu só gostaria
de esclarecer que esta série de textos não teve a intenção de criticar nenhuma
religião, sei que é um tema polêmico, mas minha verdadeira intenção aqui foi trazer
alguns pontos sobre a evolução que geralmente são esquecidos quando se debate
sobre o assunto. As reflexões foram só para deixar o texto mais leve. E eu
gostaria de relembrar algo que a humanidade vem esquecendo: somos histórica e
ecologicamente ligados ao nosso planeta e a todas as demais espécies que nele habitam
e como numa teia de aranha, de qualquer ponto se pode sentir uma perturbação em
qualquer outro ponto. Muito obrigado a todos que em algum momento pararam para ler meus textos!
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