Herbert C. S. Araújo
“Se, portanto, queremos Igrejas e Estados bem ordenados e florescentes e boas administrações, primeiro que tudo ordenemos as escolas e façamo-las florescer, a fim de que sejam verdadeiras e vivas oficinas de homens e viveiros eclesiásticos, políticos e econômicos. Assim facilmente atingiremos o nosso objetivo; doutro modo, nunca o atingiremos.” (Comênio, apud. Silva, sd.)
Se, por um lado, a proposta de
Comênio mostra a importância da educação para a organização e desenvolvimento
da sociedade, por outro nos aponta boas pistas para se compreender não apenas o
quanto a educação está inseparavelmente ligada à política, mas também o quanto
ela pode ser tratada de diferentes formas conforme o projeto político ao qual
ela esteja ligada ou mesmo submetida. Assim, a proposta de Comênio vem trazer
inclusão social e democratização do processo educativo porque esse era seu
projeto de sociedade, essa era a sua filosofia, mas nem todos os povos, nações
etnias ou mesmo indivíduos almejam o mesmo projeto de sociedade, uma vez que
tais projetos mudam temporal e espacialmente, decorrendo daí uma vasta gama de
ideias acerca da educação que sempre terão por finalidade algum interesse
político, por mais democrático ou rígido que seja. Logo, à medida que se
discutem diferentes propostas pedagógicas que surgiram ao longo da história,
nós devemos ter em conta que estão sendo discutidos diferentes ideais de
sociedade.
Então, mais importante que nos
preocuparmos com a ordem cronológica na qual surge cada proposta pedagógica,
devemos antes de tudo dar ênfase ao significado que cada uma delas adquire
quando confrontada com as sociedades contemporâneas e seus problemas mais
profundos. Dito isto, se por um lado podemos dizer que a prática instrucionista
idealizada por Herbart nos parece demasiadamente impositiva (além de
racionalista), por outro lado podemos compreender que muitas “escolas”,
sobretudo as de natureza privada, acolhem com muito interesse os modelos
tradicionalistas e o instrucionismo.
Ora, se realmente acreditamos que
professores são profissionais conscientes, logo reconheceremos que tal postura
não é assumida por acaso. Dito de outra forma, a escola tem um papel social e
tem um papel político, por isso, quando pensamos em diferentes metodologias de
ensino, em diferentes práticas pedagógicas, modelos de ensino ou formas de
planejamento da atividade docente, não devemos nos limitar à dualidade do certo
ou errado, mas assumirmos a responsabilidade ética de escolher a qual projeto
político nossa prática docente vai se vincular.
Outro aspecto interessante da
educação é que seu caráter ideológico está muitas vezes ligado aos interesses
das minorias privilegiadas. Falando abertamente, há grupos que se valem da
educação com a finalidade explícita de exercer poder e domínio, afinal...
"O
conhecimento dá poder (...). O poder dos antigos ou dos sábios, o dos
feiticeiros ou dos curandeiros, nas sociedades arcaicas, é um poder dos
superconhecedores. O poder sacerdotal das sociedades antigas é um poder de
superconhecedores. O poder tende a monopolizar o conhecimento, para conservar o
monopólio de seu poder, e assim o conhecimento se torna secreto, esotérico.
Assim, portanto, os Grandes Sacerdotes, Iniciados, Universitários, Cientistas,
Experts, Especialistas tendem a se constituir em castas arrogantes, dispondo de
privilégios e de poderes." (Morin, in
Diegues, 2001).
Dewey, por sua vez, recomenda que
o conhecimento seja produto da ação dos aprendizes, que movidos pela sua
curiosidade busquem o conhecimento para satisfazerem seus próprios anseios e
interesses, o que constitui algo fundamental no processo de formação de
indivíduos livres, capazes de assumirem a atitude de aprendizes. Essa
capacidade de agir e aprender, nos leva a reconhecer também como o processo de
formação se constitui importante na caracterização de um cidadão capaz de suas
escolhas.
Piaget e Vigotsky também merecem
destaque pelo fato de terem demonstrado as influências que o meio tem sobre o
processo de aprendizado, transformando a escola não apenas num “celeiro” mas
também num espelho do meio, ou seja, embora um autor dê maior ênfase ao meio
social enquanto que para o outro o foco tenha sido os objetos (ou o meio
físico), ambos demonstram como a aprendizagem está ligada à vivência no
mundo. Mas ainda há que se considerar
algo mais: não basta estar no mundo, é também necessário estar com o mundo,
como defende Paulo Freire. Para Freire, o ato de educar deve ser uma atitude de
amor e respeito pela humanidade do outro. E esse outro tem o direito de ser
livre, de ser respeitado, de tomar suas decisões e de estar com o mundo e
modificá-lo por meio de sua ação, mas antes de tudo é necessário ajudá-lo no
processo de conscientização, ajudá-lo a educar-se no sentido mais amplo do
termo, e em sentido amplo, educar significa socializar.
Mentes aprisionadas, dominadas e
alienadas dificilmente conseguirão discernir e decidir livremente seus rumos ou
os da sociedade. Só um cidadão consciente, está apto a assumir a
responsabilidade ética e política de decidir para qual ideal de sociedade ele
quer contribuir.
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