domingo, 23 de fevereiro de 2014

Filogenética #Genética Traduzida e Comentada



O grande número e a grande diversidade de seres vivos
os torna um bom quebra-cabeças a ser resolvido: missão para...
TAXONOMISTAS!
Na Biologia, a sistemática é o estudo e classificação dos seres vivos de acordo com suas afinidades e parentesco evolutivo. Ao longo da história, foram criadas várias formas de classificação e de acordo com Frankham et al. (2008), para a pergunta ''O que é uma espécie?'' existem pelo menos 22 definições, incluindo definições baseadas em morfologia, genética, história evolutiva etc. 

Com o advento da Genética, Biologia Molecular e Bioquímica, tornou-se possível que além da forma dos organismos, pudessem também ser utilizadas características bioquímicas, fisiológicas e genéticas entre outras, aumentando a precisão dos estudos de classificação que, quando abordados a partir do pressuposto da ancestralidade comum e correlacionados ao paradigma evolutivo, chamamos de filogenética.

Significa um grande avanço, mas como todo processo de classificação, sua credibilidade depende de um esforço amostral muito cuidadoso e de um tratamento adequado das análises de dados.

É muito comum a ideia errada de que a filogenética representa o abandono da utilização de características morfológicas para classificação sistemática dos seres vivos. Na verdade, as abordagens filogenéticas também utilizam caracteres morfológicos, a questão é que há espécies distintas que, do ponto de vista morfológico, são idênticas. Nesses casos, se faz de grande importância a abordagem filogenética, que é cada vez mais utilizada por taxonomistas, abordando diferentes características, inclusive genéticas, mas não exclusivamente. E existem sim (é claro!) árvores filogenéticas utilizando dados genéticos.

Os estudos filogenéticos têm confirmado que muitos táxons estabelecidos por taxonomistas que utilizaram classificação morfológica foram mantidos pelos estudos filogenéticos (SOUZA & LORENZI, 2008) e mesmo reconhecidos como monofiléticos, como a família botânica Asteraceae, um grupo taxonômico estabelecido tradicionalmente e considerado monofilético sob qualquer tipo de análise (RAMOS, 2011). O bom mesmo é ver as evidências morfológicas e moleculares se cruzando na ''reforma da filogenia'', essa é uma reavaliação importante, pois é assim que a ciência avança, com o pensamento reflexivo atuando para reinterpretar as tecnologias e diferentes tendências e teorias.

Para uma discussão completa, clique aqui.

Alguns casos interessantes de elucidações e controvérsias entre diferentes abordagens de classificação:


PUMAS DA AMÉRICA DO NORTE

Os mastozoólogos reconheciam aproximadamente oito subespécies de pumas norte-americanos, entretanto, análises de marcadores microssatélites e DNAmt não encontrou nenhuma diferenciação significativa.


TUATARAS

As tuataras são os únicos sobreviventes de uma ordem primitiva de rapteis e pensava-se que se tratava de uma única espécie. Estudos de 25 locos de aloenzimas e dados de morfologia, revelaram se tratar de três grupos, Sphenodon punctatus punctatus, S. P. western e S. guntheri.


VERMES-DE-VELUDO

Os vermes-de-veludo (Filo Onychophora), tiveram reconhecidas apenas sete espécies em 1985, baseada na morfologia. Agora, são reconhecidas 100 espécies com o uso de aloenzimas e microssatélites.




REFERÊNCIAS


ASSIS, L. C. S. Sistemática e filosofia: filogenia do complexo Ocotea e revisão do grupo Ocotea indecora (Lauraceae). Tese de Doutorado. Universidade de São Paulo. 2009.

FRANKHAM, R.; BALLOU, J. D.; BRISCOE, D. A. Fundamentos de Genética da Conservação. Ribeirão Preto: Sociedade Brasileira de Genética, 2008.

RAMOS, R. R. P. A família Asteraceae Bercht. & J. Presl em afloramentos rochosos da caatinga paraibana: riqueza, morfologia e distribuição. 2012.


SOUZA, V. S. & LORENZI, H. Botânica Sistemática: guia ilustrado para identificação das famílias de Angiospermas da flora brasileira, baseado em APG II. Instituto Plantarum de Estudos da Flora, Nova Odessa, 2008.

domingo, 16 de fevereiro de 2014

Contra a Extinção das Espécies #Genética Traduzida e Comentada



       A genética da conservação é o uso da teoria e técnicas da genética para reduzir os riscos de extinção em espécies ameaçadas. Estamos vivendo a sexta grande extinção de espécies da história da Terra e ela é fruto da ação humana. De acordo com os dados de 2008, estavam classificadas como ameaçadas muitas espécies: peixes (30%), anfíbios (21%), répteis (25%), aves (12%) e mamíferos (24%), segundo a União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN). Vale lembrar que de lá para cá, ocorreu, por exemplo, a extinção do rinoceronte negro ocidental -Diceros bicornis longipes- que se encontrava criticamente ameaçado em 2008.

 
       Para se ter uma noção do quanto que as atividades humanas têm causado danos preocupantes à biodiversidade, vejamos alguns dados sobre espécies extintas entre os anos de 1600 e 2002 :

Táxons
Total
Porcentagem de táxons
Porcentagem de extinções em ilhas
Mamíferos
85
2,1
60
Aves
113
1,3
81
Répteis
21
0,3
91
Anfíbios
2
0,05
0
Peixes
23
0,1
4
Invertebrados
98
0,01
49
Plantas com flores
384
0,2
36











Como podemos ver, as plantas são as mais atingidas, com 384 extinções até então. Ainda de acordo com a IUCN, as plantas também apresentam o maior número de espécies ameaçadas (48% de todas as espécies), com 53% dos musgos, 23% das gimnospermas, 54% das angiospermas dicotiledôneas e 26% das monocotiledôneas nesta situação.

Sobre a extinção das espécies, precisamos compreender inicialmente os seguintes aspectos:

a)      A extinção é um processo natural e até mesmo necessário ao processo evolutivo;

''De acordo com a teoria da seleção natural, a extinção das formas antigas e a criação de novas formas aperfeiçoadas estão diretamente relacionadas.'' (Charles Darwin)


b)      Ao longo da história da Terra, houve cinco grandes extinções de espécies e mesmo assim a biodiversidade se restabeleceu após essas grandes extinções;

c)      Atualmente, as atividades humanas têm acelerado a extinção das espécies de modo preocupante.


As espécies persistem tipicamente por 5-10 milhões de anos. Quando as extinções são balanceadas pela origem de novas espécies (especiação), a biodiversidade é mantida. No entanto, isso não ocorre nas extinções em massa (para saber mais, sobre as extinções em massa, leia: O Sentido Que a Evolução dá à Vida, da série Dez Argumentos em Defesa da Evolução).

       Assim como em muitas áreas do conhecimento, a genética também vem dando importantes contribuições nos cuidados com as espécies ameaçadas de extinção. Entre as principais causas de extinção, atualmente encontram-se a perda de hábitat, a introdução de espécies em áreas indevidas, a sobre-exploração e a poluição.

        Um dos aspectos mais importantes para a genética da conservação é o tamanho de uma população (população biológica é a quantidade de seres DA MESMA ESPÉCIE que vivem em uma determinada área). O risco de extinção é estimado com base no tamanho da população e na taxa de declínio populacional.

       Quando as populações naturais diminuem, elas se tornam mais vulneráveis a efeitos estocásticos (acidentais) negativos, como a endogamia (cruzamento entre ''parentes próximos'', ou seja, filhos de pais relacionados, ou próximos), a deriva genética (oscilações na frequência de alguns alelos na população, podendo haver inclusive o desaparecimento de alguns alelos) e catástrofes ambientais.

       A endogamia reduz a taxa de nascimentos e aumenta a taxa de mortalidade, além de não ser favorável à variabilidade genética. A perda da diversidade genética, decorrente da diminuição de uma população natural, reduz a habilidade de tal população adaptar-se às mudanças ambientais por meio da seleção natural.


      Cada espécie que desaparece, é uma perda inestimável à humanidade e ao meio ambiente. A conservação de uma espécie biológica é ao mesmo tempo uma necessidade econômica, ecológica, estética e ética.



REFERÊNCIAS:


FRANKHAM, R.; BALLOU, J. D.; BRISCOE, D. A. Fundamentos de Genética da Conservação. Ribeirão Preto: Sociedade Brasileira de Genética, 2008.

DARWIN, C. R. A Origem das Espécies. Mantin Claret. 4ª Ed. 2004.



SITES

The IUCN Red List of Threatened Specieshttp://www.iucnredlist.org/details/39319/0




domingo, 9 de fevereiro de 2014

Genética do Câncer #Genética Traduzida e Comentada


Assim como são vários os tipos de câncer, também são numerosos os vilões e aliados em seu combate. Sem dúvida, uma característica marcante nos diferentes tipos de câncer, é sua capacidade de multiplicação e de migração para outros tecidos do corpo. O que o faz assim?

O câncer é uma doença genética por estar associada a alterações de genes específicos, mas só é hereditário quando o defeito genético está presente nos cromossomos do pai ou da mãe e é transmitido ao zigoto. Assim, as alterações genéticas que levam à maioria dos cânceres surgem no DNA de uma célula do corpo durante o período de vida do indivíduo acometido.


Diz-se que células cancerosas são imortais. Enquanto células normais só perduram em determinado período de tempo em laboratório, as células cancerosas podem se reproduzir durante décadas em tais culturas.

Células normais apresentam um número limitado de divisões, ao passo que as células cancerosas dividem-se indefinidamente, o que é muitas vezes atribuído à presença de telomerases, enzimas que atuam na manutenção dos telômeros dos cromossomos (os telômeros são estruturas das extremidades do cromossomo cujo desgaste promove nosso envelhecimento). A característica mais importante de uma célula cancerosa é sua perda de controle da multiplicação, apresentando uma ausência de resposta a sinais externos que limitariam as células normais de cessarem seu crescimento e divisão. 

Em se tratando de cultura in vitro (imagem acima), as células normais apresentam-se em uma única camada de células, cessando ou reduzindo seu crescimento em número logo que cobrem o fundo da placa em cultura, ao passo que as tumorais geralmente apresentam aumento contínuo, chegando a formar várias camadas de células na cultura.

Além disso, células tumorais freqüentemente apresentam aneuploidia (havendo lotes de cromossomos altamente aberrantes ou anormais), o que causa seu desenvolvimento alterado (neoplasia). Em células normais, quando há alteração do conteúdo cromossômico, uma via de sinalização geralmente é ativada, ocasionando a destruição da célula (apoptose – morte celular programada), considerando-se assim que a falha em sofrer apoptose é uma característica importante que distingue células neoplásicas de células normais.

Tais mutações podem ter importância no processo evolutivo. Em texto intitulado ''Câncer: uma nova forma de vida?'' publicado em seu blog na página on-line do jornal Folha de São Paulo, Reinaldo Lopes trata de um câncer (CTVT - tumor venéreo transmissível canino) cujas mutações vêm preservando uma certa identidade genética possivelmente há 11 mil anos. O mais impressionante é que esse câncer transmissível entre cães ''se comporta mais como um parasita semi-independente que como uma doença'' diz o jornalista científico.

Há genes que codificam proteínas responsáveis por essa perda de controle na reprodução celular. São os chamados oncogenes, genes dominantes que atuam acelerando a proliferação celular e a geração de tumores. A origem desses genes decorre da mutação de proto-oncogenes.

As células geralmente têm proto-oncogenes, que originalmente atuam em processos normais, mas que podem ser alterados por diversos mecanismos, como:
  • Mutação que altere as propriedades do produto gênico, que com isso não pode mais desempenhar a função normal.
  • Mutação em uma sequência reguladora próxima, gerando uma produção excessiva do produto gênico.
  • Um rearranjo cromossômico pode deslocar uma determinada sequência de DNA anteriormente localizada distante seja deslocada para uma região muito próxima a um gene, também podendo alterar a natureza do produto gênico.












As mutações e as causas do câncer

As causas de certos tipos de cânceres são bem conhecidas, de modo que se conhecem alguns agentes mutagênicos e carcinogênicos, como a relação entre o câncer de pulmão e o hábito de fumar, bem como o fato de que a radiação ultravioleta causa câncer de pele, por exemplo. O primeiro a correlacionar o surgimento do câncer a um agente ambiental foi o cirurgião britânico Percival Pott (1775), que concluiu que a alta incidência de câncer no nariz e escroto de limpadores de chaminé estava relacionada à exposição crônica à fuligem.

Os agentes ambientais que causam câncer podem ser a ação de diversas substâncias, radiação ionizante, ou uma variedade de vírus de DNA (o SV 40, adenovírus e vírus do tipo herpes, por exemplo) e de RNA, sendo todos esses fatores capazes de alterar o genoma. Hábitos saudáveis, como não fumar, usar protetor solar e evitar contato com substâncias que causam mutações ou tumores, são sempre medidas importantes.

Genes que codificam proteínas envolvidas no reparo de mal pareamento.

Se o câncer é uma doença genética que resulta de alterações no DNA, então qualquer atividade que aumente a freqüência de mutações genéticas pode aumentar o risco de câncer. Assim, uma alteração em um gene que codifique uma proteína do mecanismo de reparo do DNA, também pode propiciar o surgimento de câncer. 

A primeira evidência concreta de que um defeito no reparo de mal pareamento de bases do DNA poderia ser um fator para desenvolvimento de câncer foi em 1993 em estudos com um tipo de câncer de cólon que não forma pólipos (HNPCC).

A análise do DNA de pessoas com HNPCC revelou que os microssatélites de células tumorais freqüentemente apresentam diferentes comprimentos nas sequências correspondentes do DNA de células normais, tais variações seriam esperadas entre diferentes indivíduos, mas não entre diferentes células da mesma pessoa. Alterações no comprimento de uma sequência de microssatélite surgem como um erro durante a replicação do DNA e a diferença no comprimento das seqüências de nucleotídeos nas duas fitas gera alças que podem ser corrigidas pelo mecanismo de reparo, mas as células tumorais de HNPCC in vitro, não apresentaram maquinaria de reparo por não ser normais.

De fato, um gene defeituoso responsável pelo HNPCC é carregado por 0,5% da população, responde por cerca de 5% do referido câncer e a análise do DNA de pessoas com HNPCC também revelou que grande número delas apresenta mutações debilitantes em genes que codificam para proteínas do mecanismo de reparo de mal pareamento.

Tratamentos  

Além da quimioterapia tradicional, o avanço do conhecimento do câncer vem possibilitando novos tratamentos, por exemplo:

Terapia gênica - tratamento no qual o genótipo do indivíduo é alterado pela adição, deleção ou modificação de um gene específico.

Imunoterapia - método que tenta dar ao sistema imunológico maior envolvimento na luta contra células malignas. O sistema imunológico tem evoluído para reconhecer e destruir materiais estranhos, mas cânceres são derivados da própria pessoa acometida. A imunoterapia pode agir por meio do processamento de fatores que promovem a resposta imunológica, ou modificando células defensoras geneticamente para melhores resultados nesses casos, entre outras técnicas.





Referências



KARP, Gerald. Biologia celular e molecular: conceitos e experimentos. Editora Manole Ltda, 2005.

GRIFFITHS, Anthony JF et al. Introdução à genética. Guanabara Koogan, 2006.



SITES: 

Jornal Folha de São Paulo: http://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2014/02/06/o-cancer-uma-nova-forma-de-vida/ (último acesso em: 10/02/2014).

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

DNA e Criminosos – Técnicas e (des)vantagens na Genética Forense #Genética Traduzida e Comentada

Um caso de difícil resolução...

    Em 1985, no condado de Leicestershire, em um local rodeado de montanhas, que possuía apenas uma entrada, mais precisamente no vilarejo de Narborough, Inglaterra, foi encontrado o corpo de uma jovem que teria sido vítima de um estupro e logo depois assassinada. Apesar da violência do crime praticado, esse fato poderia ter se perdido entre tantos outros semelhantes na história. Mas ali morava um homem cujo conhecimento foi capaz de mudar não apenas os rumos da tragédia, como também de inaugurar uma nova fase da investigação criminal: a identificação por DNA. A partir de então, essa estratégia emergiu como uma das ferramentas mais importantes para a ciência forense. 

    Hoje, não é difícil encontrar relatos do caso na internet. Alec Jeffreys, era um geneticista, médico e professor da Universidade de Leicester. Ele havia publicado, não muito tempo atrás, um artigo na Nature sobre regiões do DNA chamadas minissatélites, com base nas quais um especialista poderia identificar uma pessoa com praticamente 100% de certeza. A polícia recorreu à sua ajuda.

  Uma segunda vítima, que parecia ter sido morta do mesmo modo, apareceu nas proximidades.  As autoridades prenderam um suspeito que confessou os crimes, mas o exame do DNA, com base no sêmen encontrado nas vítimas, não confirmou serem o preso e o criminoso a mesma pessoa, complicando ainda mais a situação. Para resumir a história, as autoridades locais forjaram uma campanha de doação de sangue e, mais uma vez, nenhuma amostra analisada era compatível no teste de DNA. Foi quando alguém lembrou ter ouvido uma conversa de que um padeiro teria entrado na fila para doar sangue no lugar de Colin Pitchfork, também padeiro.

    O caso foi resolvido quando a polícia foi em busca de Colin e ele forneceu seu sangue para o exame de DNA, que confirmou ser ele o verdadeiro praticante dos crimes (posteriormente, ele confessou a autoria). Foi assim que se deu a primeira resolução de uma investigação criminal com base em DNA. E o metido que dizia ser o estuprador aparentemente para ganhar fama, conseguiu: entrou para a história como o primeiro homem a ser inocentado através de um teste de DNA.


Sobre os métodos

    O FBI criou um banco nacional de dados com perfis genéticos de criminosos para contribuir com as investigações. É possível utilizar a identidade genética para demonstrar culpabilidade de criminosos, elucidar trocas de bebês em berçários, identificar corpos e restos mortais em desastres e campos de batalha, determinar paternidade com uma confiabilidade praticamente total. Disso todo mundo já sabe, mas como funciona? Em que casos pode ser aplicado? Há casos em que os testes de DNA não sejam a melhor saída?

   Nos casos em que gêmeos idênticos sejam suspeitos e que o criminoso tenha deixado vestígios, o DNA deixa de ser uma fonte segura, pois gêmeos idênticos são os únicos indivíduos que possuem cópias idênticas do genoma humano. Nesses casos, de acordo com Koch & Andrade (2008), se possível, mais útil seria analisar as impressões digitais, uma vez que o DNA em nada poderia ajudar. Além disso, a coleta das amostras requerem extremo cuidado para que não haja contaminação com DNA de outra pessoa e a análise não gere resultados confusos. Se as amostras não forem coletadas e processadas com cuidados adequados, podem não cumprir os requisitos judiciais e científicos para sua aceitação em tribunais.

    A característica mais importante do DNA para a ciência forense é ser uma molécula que possui regiões que podem distinguir uma pessoa de outra com alto grau de certeza. Também vantajoso é que ele está em amostras mínimas de fluidos biológicos e diversos tecidos, em todas as células nucleadas, pois como o DNA está no núcleo das células, praticamente qualquer vestígio do corpo de uma pessoa irá conter essa molécula. Outra vantagem é se tratar de uma molécula de grande estabilidade química, o que permite que sua amostra seja conservada por longos períodos, até mesmo no ambiente natural.

    Uma limitação anterior: eram convenientes para estudos desse tipo, apenas amostras com células nucleadas, mas fora do núcleo celular, existem organelas importantes no fornecimento de energia para as células, chamadas mitocôndrias, que possuem DNA próprio (há evidências de que no passado, as mitocôndrias eram microrganismos endossimbiontes que com o estreitamento dessa relação, se tornaram parte das células eucarióticas). Com o sequenciamento do DNA mitocondrial, atualmente está se superando a dependência de amostras de células nucleadas.

    Na verdade, o DNA mitocondrial oferece vantagens, uma vez que está presente em número de 500 a 2000 cópias por célula, sendo uma amostra mais abundante e independe de amostras de células nucleadas. Ainda, o DNAmt é herdado apenas do gameta materno, permitindo a identificação rápida de relações familiares pela linhagem materna; o DNAmt possui duas regiões muito úteis na investigação, chamadas regiões hipervariáveis (HV1 e HV2), onde a taxa de mutação é de 5 a 10 vezes maior que no DNA nuclear, o que caracteriza um considerável polimorfismo (variação) que ajuda a distinguir indivíduos.

    A palavra polimorfismo, aqui se refere a regiões do DNA onde a sequência de nucleotídeos difere em cada membro da população. Com base no grande número e tipos de variações é que se pode identificar uma pessoa. Regiões genômicas que apresentam diferenças entre indivíduos normais constituem marcadores moleculares. O mais comum é o estudo de regiões repetitivas (mas com padrão de repetição variando de pessoa para pessoa) chamadas microssatélites (STRs) e minissatélites (VNTRs).


Algumas técnicas:

    ELETROFORESE – é uma técnica por meio da qual se separam moléculas de acordo com características físicas como massa, tamanho, carga elétrica e compactação. Simplificando: colocam-se amostras de DNA em uma coluna de gel (agarose ou acrilamida) e subemete-se as amostras a um campo elétrico (diferença de potencial de 50 a 120v). Como as moléculas de DNA são carregadas negativamente, elas tendem a migrar ao longo da coluna de gel em direção ao pólo positivo, sendo possível distinguir diferentes amostras pela velocidade de migração. Por exemplo, moléculas menores migram mais rápido e depois de algum tempo, moléculas de tamanhos diferentes estarão localizadas a distâncias diferentes. Para a visualização das moléculas, é utilizado brometo de etídio, que torna o DNA fluorescente.

   CLONAGEM DE DNA E PCR (Polimerase Chain Reaction) – como foi mencionado no texto Reprodução: Comunicando o Código da Vida, existe uma enzima chamada DNA-polimerase que tem a capacidade de produzir cópias de uma molécula de DNA e é com base nela que funciona a técnica denominada PCR, a reação em cadeia da DNA-polimerase, utilizada na clonagem e análise de um DNA de interesse, que poderá então ser utilizado em diversos tipos de investigação e pesquisa. É rápida, não requer grandes fragmentos de DNA e, dada sua especificidade, possui alto poder de discriminação; para a sua realização, é necessário que já se tenha alguma informação prévia sobre o DNA analisado, pois é uma técnica de aplicação específica e voltada para trechos também específicos de DNA. Ela consiste em utilizar a DNA-polimerase para amplificar de sequências do DNA de interesse por meio da produção de cópias, potencializando as análises pelo aumento do número de amostras.

    SEQUENCIAMENTO o sequenciamento constitui um dos processos mais importantes em estudos desse tipo, pois permite a identificação exata da sequência de nucleotídeos do DNA estudado. Foram desenvolvidas várias técnicas de seqüenciamento, desde processos manuais até os automatizados. O sequenciamento inclui PCR, mas com algumas diferenças. Para seqüenciamento, são adicionados análogos capazes que se localizam no lugar de um determinado nucleotídeo do DNA e, nesse lugar, é bloqueado o crescimento da cadeia que cresce durante a PCR. Assim, é possível saber a localização das bases pelo local onde houve a interrupção da reação (o nome é bem complicado: interrupção controlada de replicação enzimática). O sequenciamento automático se vale também de DNA amplificado por PCR e desoxirribonucleotídeos incorporados, como no processo manual, mas que foram marcados com fluorescência. Um feixe de laser percorre a amostra excitando os marcadores fluorescentes que emitem diferentes comprimentos de onda, como base nos quais se detectam as posições das bases (ou seja, as letras do código genético). É um processo complicado e caro, mas que permite obter um conjunto robusto de informações de alta confiabilidade para pesquisas científicas e investigações criminais.






REFERÊNCIAS

KOCH, A. & ANDRADE, F. M. A utilização de técnicas de biologia molecular na genética forense: uma revisão. RBAC, vol. 40(1): 17-23, 2008.

SITES: